quarta-feira, 25 de julho de 2007

[Sem vida]

A cena é a seguinte: quatro pessoas num ponto de ônibus. Ao olhar a minha direita vejo uma senhora chegando com algumas poucas, porém visivelmente pesadas, sacolas e pára no ponto onde estávamos. De repente a senhora observa o ônibus que estava aguardando chegar. Junta as suas sacolas, dá um sinal para o motorista e... ele não pára. Simplesmente não parou. Ainda vi o motorista sorrir para aquela senhora. Na sequência veio o ônibus que eu esperava. Não deu tempo sequer de conversar com aquela mulher. Mas antes de subir no ônibus, olhei firmamente nos olhos dela e vi lá, estampada, a sua revolta. Subi no ônibus, entreguei o passe ao motorista, que rapidamente o carimbou e me devolveu, andei pelo corredor atrás de um lugar vago, achei, sentei e chorei. Fiquei muito - diria extremamente - indignado com o que tinha acabado de ver. E ao lembrar-me dessa história, para vir aqui escreve-la, fiquei tão triste quanto fiquei naquela tarde.

Terça-feira, 17 de julho de 2007: um avião com mais de 180 pessoas não consegue concluir a frenagem numa pista de vôo no aeroporto de congonhas. Uma tragédia. O avião atravessa a pista e colide com o prédio da empresa TAM. Uma explosão noticiada imediatamente pelas grandes redes de televisão e pela internet. Dezenas de pessoas mortas ali. Corpos carbonizados no avião, corpos soterrados nos escombros do prédio. No noticiário era exibido imagem de pessoas quase se atirando pelas janelas do prédio tal o desespero delas com o calor feroz que o fogo produzia ali dentro. Famílias inteiras clamando por noticias dos seus. Medo, angústia, pavor...

E hoje, e só hoje fui me sentir o pior dos homens. Em nenhum momento em todos estes dias que me separaram do acidente fatal, fiquei tocado, sensibilizado, indignado, revoltado, enlutado ou coisa parecida com a tragédia. Era como se aquilo tudo fosse apenas mais um acidente anunciado na TV Globo. Não sei explicar isso. Ou pelo menos não sei se consigo me fazer entender. Um acidente desses deveria me fazer repensar na vida: ser solidário a dor das famílias, tornar-me mais um brasileiro revoltado com o descaso das competências, dialogar com outras pessoas que se sintam a mesma indignação que estou sentindo só agora (e estou altamente envergonhado pelo meu "time" de sensibilidade). Mas vi no meu círculo social que não haviam pessoas falando disso. A conversa mais pronfuda presenciada por mim era algo do tipo: "Você viu o acidente da TAM?", "Vi! Que desgraça hein?!", "Pois é!"

Penso que as vidas perdidas não me atingiram porque não conhecia ninguém que fosse vitima deste acidente. Quanta idiotice! É tão corriqueiro você assistir aos noticiários e ver o tanto de pessoas que morrem por dia, seja aqui no Brasil, seja no Iraque, seja por acidente de avião, seja por um acidente com ônibus escolar. E algumas pessoas possuem uma filosofia de vida com a premissa de que "quando chegou a hora não tem como fugir". Será?